“Privacidade financeira é um direito humano básico” diz Riccardo Spagni, mantenedor do projeto Monero

Traduzido e adaptado do artigo original em inglês por Larry Cermak, publicado em theblockcrypto.com

Em palestra durante um evento de criptomoedas em Davos, Riccardo Spagni, o principal mantenedor do projeto Monero, citou os motivos pelos quais ele acredita que a privacidade é importante e por que ele acha que também deveria ser importante para todos. Segundo Spagni, a privacidade financeira é um direito humano básico.

“A privacidade não é algo que você quer ter apenas para ficar se escondendo enquanto planeja derrubar o governo, ela é o estado natural das coisas”, diz ele. “Por exemplo, quando você vai ao banheiro, você geralmente fecha a porta. E você não faz isso porque planeja derrubar o governo enquanto está no banheiro. Alguns até podem fazer isso, mas você provavelmente não. Você só quer usar o banheiro”.

A privacidade é realmente importante nas finanças, de acordo com Spagni. À medida que as pessoas estão deixando de usar as cédulas e estão passando a usar cartões de crédito e outras soluções de pagamento, elas estão ganhando conveniência ao mesmo tempo em que estão perdendo privacidade. É extremamente conveniente fazer um pagamento com um smartphone, mas todos os pagamentos digitais envolvem muita regulamentação – leis que exigem que as empresas cadastrem seus clientes (KYC), leis contra lavagem de dinheiro (AML), entre outras. Portanto, o que estamos vivenciando hoje é uma troca de privacidade por conveniência.

Spagni afirma que a privacidade financeira não deveria ser uma fonte de preocupação apenas para criminosos; todas as pessoas deveriam se preocupar com a segurança e a privacidade de seus dados. Por exemplo, as pessoas devem se conscientizar que um dia o histórico das transações que elas já fizeram pode ser roubado de lojas online, de bancos ou de empresas de cartão de crédito, ou simplesmente ser vendido a terceiros.

Ele também citou alguns exemplos das consequências que podem surgir com o vazamento de informações muito sensíveis:

  • Anúncios baseados em hábitos de consumo
  • Seguros de saúde sendo calculados de acordo com quais medicamentos são comprados na farmácia ou com a frequência que uma pessoa vai à academia
  • Empresas sendo capazes de deduzir informações sobre as finanças de uma empresa concorrente, como as margens de lucro ou quais são os fornecedores da empresa
  • Criminosos escolhendo especificamente algumas pessoas, baseando-se em quanto a pessoa ganha ou se ela esteve no caixa eletrônico recentemente

Também foram lembrados os cinco pilares da privacidade das criptomoedas:

  1. Desvinculação – esconder o destino (para onde as transações estão indo)
  2. Não rastreabilidade – esconder a origem (de onde as transações estão vindo)
  3. Valor da transação escondido através de criptografia – nenhum observador externo consegue descobrir quanto que está sendo transferido
  4. Passivamente escondido – esconder o endereço IP que originou a transação
  5. Não opcionalidade – obrigar todos os usuários a usar a funcionalidade de privacidade, maximizando o conjunto do anonimato, enquanto ao mesmo tempo permitir que se possa voluntariamente revelar algumas informações sobre as suas transações para terceiros

Spagni afirmou que a privacidade opcional é um dos grandes problemas das outras criptomoedas privadas, como a Zcash (ZEC). Nesta moeda, as transações são públicas por padrão, mas há a opção de se realizar as transações de forma privada. Segundo Spagni, a maioria dos usuários é preguiçosa e jamais usará a funcionalidade de privacidade. Em função disso, nas moedas com privacidade opcional, como os usuários que estão usando a funcionalidade de privacidade estão em menor número, se torna muito mais fácil isolá-los.

“Ao contrário do que muitos legisladores pensam, a privacidade obrigatória não é uma rebeldia contra o governo ou as leis. Ela apenas significa que o usuário é a pessoa que tem o poder de decidir quem pode ver esses dados”.

Segundo Spagni, há um sexto pilar que muitos ignoram, que é a ideologia. Os colaboradores do Monero tem consciência de que eles são responsáveis ​​por garantir a segurança do dinheiro que é usado por muitas pessoas. Eles sabem que são responsáveis por proteger as economias da vida de alguém, que suas ações podem acabar influenciando se um inocente irá ou não para a prisão, que suas ações podem até mesmo proteger a vida de alguém.

“E é por isso que todo o trabalho no projeto Monero é levado extremamente a sério. Eu acredito que qualquer projeto de privacidade que não trate esse assunto com seriedade não apenas pode ser considerado como uma fraude, como profundamente desonesto, pois estão colocando a vida de pessoas em risco”.

Ao concluir, Spagni contou que sempre que ele escuta alguém dizer “eu não tenho nada a esconder, pois não faço nada de errado”, ele pede para a pessoa mostrar os extratos bancários dos últimos meses. “Surpreendentemente, ninguém nunca me mostrou extrato algum”. Como Edward Snowden disse, “dizer que você não se importa com o direito à privacidade, pois você não tem nada a esconder, é a mesma coisa que dizer que você não se importa com a liberdade de expressão, pois você não tem nada a dizer”.