Entrevista com Paul Janowitz, integrante do Core Team

Traduzido e adaptado para o Português do Brasil a partir da entrevista realizada por Crypto Rand.

Tivemos o prazer de entrevistar Paul Janowitz, integrante do Core Team da Monero.  Considerado por muitos um projeto pioneiro no sistema das criptomoedas privadas, o Monero possui código aberto e tem como principal objetivo dar poder às pessoas para que elas possam controlar e ter responsabilidade sobre suas próprias finanças.

Como você descreveria os principais pilares do projeto?

Segurança, privacidade e fungibilidade. A fungibilidade em especial é primordial para o Monero, pois ela faz com que as moedas sejam indistinguíveis entre si. Como todas as moedas são iguais e não há nenhum histórico visível, nenhuma moeda pode ser considerada “suja” (vinculada a atividade ilícita) e é impossível analisar a blockchain a fim de se criar uma lista negra das moedas com histórico “sujo”.

 Em relação à equipe, quais são os seus pontos fortes?

O Monero é um projeto de código aberto sem qualquer organização centralizada ou empresa por trás. Qualquer desenvolvedor interessado no projeto pode participar e a maioria deles contribui voluntariamente. No entanto, existe também um sistema de financiamento coletivo (CCS), através do qual qualquer pessoa pode sugerir uma ideia que precisa de financiamento, e a comunidade tem a liberdade de escolher se vai apoiá-la.

Mencionarei apenas alguns dos projetos financiados dessa maneira:

Além disso, o Monero possui uma equipe de desenvolvedores core muito forte que está constantemente fazendo contribuições para o projeto. Somente em 2017, por exemplo, conseguimos desenvolver uma carteira com interface gráfica (GUI), fizemos com que as transações confidenciais em anel se tornassem obrigatórias e tornamos a sincronização dos nodos mais rápida.

No Monero não há uma liderança centralizada: todas as decisões são amplamente discutidas com todos os colaboradores do projeto.

O Laboratório de Pesquisas do Monero (Monero Research Lab – MRL) é independente dos desenvolvedores e revisa todos os novos códigos que foram criados, pesquisa melhorias no protocolo e lança boletins sobre pesquisas e desenvolvimentos realizados sobre o protocolo Criptonote.

Vocês tem alguma preocupação com o tamanho do bloco do Monero, caso ele venha a ser adotado em massa?

As transações do Monero são muito maiores do que as transações do Bitcoin devido às assinaturas em anel. A privacidade completa tem o seu preço, mas já existem pesquisas em andamento para reduzir o tamanho das transações. No entanto, o Monero já possui um tamanho de bloco dinâmico e taxas mínimas dinâmicas. Com base no tamanho de bloco médio dos últimos 100 blocos, um minerador pode aumentar gratuitamente o tamanho de seu bloco em até 10%, mas é descontado na recompensa que recebe no bloco. Este mecanismo garante que as transações com tarifas muito baixas não poderão ser usadas para fazer spam e causar distúrbios na rede.

Ao contrário de outras moedas que são apenas um clone do Bitcoin com algumas modificações, o Monero é baseado em um sistema completamente diferente do Bitcoin, o Cryptonote. Em função disso, é muito mais difícil integrá-lo nos aplicativos de carteiras e nas carteiras de hardware já existentes, visto que tudo precisa ser programado a partir do zero. No entanto, podemos ver que já há muito interesse na indústria em integrar o Monero em seus produtos, como por exemplo nas carteiras multimoedas como a Coinomi ou a Exodus, assim como nas carteiras de hardware, como a Ledger, que já está com o desenvolvimento da sua solução em andamento.

Os desenvolvedores já estão pensando sobre como irão aplicar solução em sidechains para que a escalabilidade não seja prejudicada no futuro, mais ainda não há uma necessidade urgente de implementá-las, visto que temos um tamanho de bloco dinâmico e, por enquanto, a maioria dos blocos são preenchidos com o tamanho mínimo.

Qual é o valor agregado do Monero em comparação a outras moedas privadas como a ZCash, Dash, PIVX ou Verge?

Para que uma transação seja aceita na rede Monero, ela obrigatoriamente precisa utilizar os recursos de privacidade total, ao contrário dessas outras moedas mencionadas. Em todas as outras criptomoedas privadas existentes atualmente a privacidade é opcional e ela raramente é utilizada pelos usuários, pois é complicada e/ou não é suportada pelas carteiras. O Zcash ainda não conseguiu atingir a marca de 400 transações totalmente protegidas por mês. A Dash usa mistura através de CoinJoin pelos Masternodes, ou seja, você precisa esperar até que os Masternodes façam a mistura, o que pode levar horas. A PivX faz exatamente o mesmo que o Dash, mas é ainda menor e há menos parceiros para se misturar as moedas. Em relação à privacidade da Verge, ela oferece a mesma coisa que um Bitcoin sendo executado através do TOR, permanecendo transparentes todas as transações e os saldos.

Somente o Monero oferece fungibilidade completa, onde cada moeda tem o mesmo valor que qualquer outra, não podendo ter seu histórico “contaminado”. No Monero não existe dinheiro “sujo”. Assim como o dinheiro em espécie, você não precisa se preocupar se aquele dinheiro esteve envolvido em qualquer atividade ilegal. Uma nota de R$10 sempre vale o mesmo, independente se ela foi anteriormente usada por um traficante de drogas ou uma freira. E o mesmo acontece com o Monero. Não há como dizer se a moeda foi minerada recentemente ou se já foi usada antes. Isso contrasta com as criptomoedas que possuem uma blockchain pública e transparente, como o Bitcoin, a qual pode ser analisada por qualquer pessoa e qualquer usuário pode ser acusado por atos ilícitos previamente cometidos com a criptomoeda em sua posse.

Atualmente, 100% as transações do Monero (cerca de 4.000/dia) escondem o remetente, o destinatário e o valor trocado. As outras moedas que se dizem privadas possuem uma porcentagem muito pequena de transações privadas em seu total de transações. Nessas moedas, é difícil de dizer que você realmente está fazendo uma transação privada, pois ao fazer uma transação privada em uma multidão de transações públicas, você está chamando a atenção para si. O Monero é a única moeda privada que não possui uma lista dos endereços mais ricos, pois essa lista é impossível de ser criada.

Qual a sua opinião em relação ao cenário atual para o Monero e para a indústria de criptomoedas?

Infelizmente, há muitos projetos inúteis que estão sendo financiados com quantidades absurdas de dinheiro através de ICOs, os quais não têm nenhum valor e que provavelmente nunca serão entregues. Esta bolha explodirá mais cedo ou mais tarde e isso provavelmente irá ter um impacto sobre todo o mercado de criptomoedas e também em diversos projetos importantes.

Essa correção provavelmente afetará todo o mercado, mas, depois dessa primeira queda, os projetos que realmente fazem coisas úteis e válidas devem se recuperar bem, enquanto os projetos ruins irão deixar de existir. Talvez isso ajude a indústria a amadurecer e ganhar mais atenção na mídia mainstream.

Você se preocupa com o uso de moedas anônimas por criminosos?

Nem um pouco, já que toda tecnologia de qualidade acaba sendo usada para o crime, mas esse não é o foco do Monero. A principal moeda utilizada para atividades ilegais ainda é o ouro, o dinheiro em espécie e os serviços bancários em paraísos fiscais. A privacidade não é um crime, mas sim um bem essencial em nossa sociedade.

As ferramentas como o TOR, I2P, VPN, a comunicação criptografada ou a criptografia em geral são usadas com fins legítimos, mas também podem ser usadas por alguns criminosos. Se começarmos a incluir algumas brechas, mais cedo ou mais tarde serão encontrados por criminosos, causando mais danos do que benefícios.

Vocês tem algum planejamento futuro para as atualizações importantes do Monero?

O Monero possui um dos desenvolvimentos mais ativos nas criptomoedas e muitas atualizações serão lançadas em breve. Nosso protocolo é atualizado de forma regular e agendada através de hard forks, os quais possibilitam grandes mudanças. Até hoje nós sempre tivemos consenso nos hard forks, ou seja, nunca houve um fork que resultou em uma bifurcação do Monero em duas moedas diferentes.

Apenas para mencionar algumas das atualizações futuras mais importantes:

  • Subendereços: permitem que você mantenha vários endereços públicos em uma única carteira, sem correr o risco de serem vinculados a você — a atualização já está pronta e aguardando a próxima versão;
  • Multisig: que é necessária para transações sob custódia, muito importantes no comércio — a atualização já está pronta;
  • 0MQ: está quase pronta e otimizará a comunicação entre as carteiras light e o daemon do Monero, assim como agilizará as notificações de transações recebidas.
  • Está sendo desenvolvida uma carteira oficial para celulares, tanto para iOS quanto para Android.
  • Uma carteira hardware aberta e personalizável está sendo desenvolvida, a qual funcionará exclusivamente com Monero.
  • Kovri, uma integração do I2P para o Monero está em desenvolvimento ativo e acabará com a única informação que é vazada pelo usuário do Monero: os endereços IP. Atualmente um observador externo (como o seu provedor de internet, por exemplo) consegue saber apenas que alguém está rodando um nodo do Monero no computador da rede. Ninguém consegue saber se alguma transação está sendo realizada neste computador.

Além disso, atualmente dois pesquisadores muito qualificados são financiados pela comunidade para trabalhar em tempo integral em pesquisas sobre possibilidades de escalabilidade e sobre melhorias no protocolo em geral. Então podemos aguardar muito mais novidades no futuro.

Fonte: https://medium.com/@cryptorand/interview-with-monero-team-xmr-9c94e56ad912